Poder 360 – 10/05/2025

A Baía de Guanabara, um dos símbolos mais conhecidos do Rio de Janeiro, recebe diariamente cerca de 3 milhões de litros de chorume, resíduo líquido originado da decomposição de matéria orgânica presente no lixo doméstico. Anualmente, esse volume chega a aproximadamente 1 bilhão de litros, segundo dados divulgados pelo movimento Baía Viva, que alerta para a necessidade de ações urgentes dos órgãos competentes.

Sérgio Ricardo Potiguara, fundador do Baía Viva e mestre em ciências ambientais pela UFRRJ, destaca que a região metropolitana do Rio produz cerca de 6.000 litros de chorume por dia, sendo metade desse volume gerado apenas no aterro de Gramacho, em Jardim Gramacho. “Vivemos uma crise de chorume não tratado no estado”, afirma Potiguara.

Além do despejo irregular, há ainda cerca de 500 milhões de litros de chorume armazenados de forma precária, agravando a contaminação da baía, dos manguezais e das áreas pesqueiras. O movimento denuncia também o declínio da biodiversidade marinha, os prejuízos socioeconômicos e os impactos na saúde de pescadores artesanais, que enfrentam extrema pobreza e insegurança alimentar.

Falta de fiscalização e leis ineficazes

Adacto Ottoni, professor da Uerj, ressalta a dificuldade de mensurar o volume exato de chorume despejado na baía devido às múltiplas fontes de poluição. Ele critica a ineficácia da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010), que, em sua opinião, deveria impor penalidades mais rigorosas para crimes ambientais. Ottoni também aponta falhas no monitoramento, já que a coleta de amostras durante a maré alta pode mascarar a real concentração de poluentes.

O Programa Nacional Lixão Zero, criado para eliminar lixões e promover a destinação adequada de resíduos, é visto com ceticismo por especialistas. Ottoni argumenta que, mesmo com aterros sanitários, o chorume continua sendo um problema, pois o lixo acumulado em antigos lixões ainda polui o solo e os lençóis freáticos.

Tratamento inadequado e consequências

Carlos Canejo, professor da Universidade Veiga de Almeida, alerta para o tratamento inadequado do chorume em estações de esgoto (ETEs), que não são projetadas para processar esse tipo de resíduo. “Contaminantes não tratados acabam sendo arrastados para a baía”, explica.

Em resposta, concessionárias como Águas do Rio afirmam que o tratamento de chorume segue normas ambientais e destacam investimentos em saneamento, incluindo R$ 19 bilhões para universalizar o esgotamento sanitário até 2033. No entanto, o gestor ambiental Emanuel Alencar critica a lentidão nas obras e a falta de recursos suficientes para reverter o cenário.

Cenário atual e perspectivas

O Inea (Instituto Estadual do Ambiente) nega evidências de despejo irregular de chorume na baía, mas reconhece a realização de fiscalizações periódicas. Enquanto isso, o Programa de Saneamento Ambiental (PSAM) tenta avançar com obras como coletores de esgoto, que já retiraram toneladas de resíduos da Baía de Guanabara.

A situação exige não apenas medidas técnicas, mas também conscientização ambiental. Ottoni defende políticas de redução de resíduos e educação para o consumo sustentável, já que o modelo atual ainda favorece interesses econômicos em detrimento do meio ambiente.

Enquanto isso, a Baía de Guanabara segue como um reflexo dos desafios ambientais e sociais que precisam ser enfrentados com urgência.

Fonte: Poder 360

https://www.poder360.com.br/poder-sustentavel/baia-de-guanabara-recebe-3-milhoes-de-litros-de-chorume-por-dia